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16 de Abril de 2024
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    Elasticidade na preclusão e o centro de gravidade do processo no Novo Código de Processo Civil.

    * Texto inicialmente publicado no portal Jota.

    há 8 anos

    O Novo Código de Processo Civil (Novo CPC) estabeleceu novas fronteiras ao instituto da preclusão, atribuindo-lhe propriedades elásticas, pelo que podemos falar verdadeiramente de uma “preclusão elástica”[1].

    Todavia, antes de iniciar qualquer plantação ou edificação, indispensável limpar o terreno, como bem vincava BARBOSA MOREIRA.

    Não é novidade o processo ser método de trabalho que mira a obtenção de resultado, o produto, o qual, na nossa realidade jurídica, é o provimento jurisdicional que se pretende, idealmente, justo.

    Porém, como o resultado não se obtêm imediatamente, mas ao cabo de uma série de fatos processuais, que se protraem no tempo e espaço, o processo se realiza em uma dimensão temporal.

    Portanto, na estruturação do arquétipo processual — essa série de atos e operações ligados e concatenados pela unidade de fim —, obedecem-se primeiro às razões de ordem lógica, de modo a evitar prejuízos e qualificar o ato final (sentença).

    Mas não só.

    O processo tem que prestar contas ao tempo, tendo em vista que o ideal de justiça quanto ao resultado se perde pela passagem do calendário: justiça tardia é injustiça qualificada.

    Assim, a preclusão se apresenta, por assim dizer, como instituto de acomodação, entre a necessidade de mais processo, permitindo uma melhor decisão, e a imposição de menos processo, a fim de que ao resultado se chegue mais rápido.

    Em nosso procedimento rígido, de corte marcadamente escrito, a preclusão colmata as fases processuais, encerrando-as, pelo que impele o processo em direção ao objetivo final almejado. A ideia da marcha procedimental é dominada pela preclusão, a qual, conjugada com o impulso oficial (artigo 2odo Novo CPC), empurra e dinamiza o andamento processual.

    Pois bem, tradicionalmente, pela forma de sua ocorrência, a preclusão é classificada em preclusão temporal, lógica e consumativa[2], categorias ainda presentes no Novo CPC.

    No Novo CPC as partes não têm liberdade incondicionada para suscitar questões, tendo em vista que estão sujeitas à preclusões seriadas, como apontam os artigos 63, § 4o, 104, 209, § 2o, 278, 293 e 507 do Novo CPC.

    A ausência de apresentação oportuna, a tempo e modo, de tais questões irá cobri-las pela preclusão temporal. Esta consumição gradual das questões pelo transcurso processual permite sua ultimação, finalização, bem como fecha as portas para comportamentos cavilosos das partes, que adredemente escalonem alegações, guardando melhores argumentos para o fim, num verdadeiro conta gotas processual.

    Entretanto, tal disciplina restou entrecortada significativamente pelo artigo 1.009, § 1o, do Novo CPC:

    “As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões”.

    Precisamente, esse recorte na disciplina da preclusão, aliada à ausência de recursos contra as interlocutórias (via de regra[3]), importou em mudança significativa no sistema de preclusões.

    Isso porque, em determinada medida, a ocorrência das preclusões fica protraída para a fase do recurso de apelação, em verdadeiro sistema elástico de preclusão.

    As preclusões não foram excluídas do ordenamento processual, as mesmas persistem, determinadas questões têm que ser oportunamente articuladas, como se verificam dos dispositivos acima alinhados, sob pena de precluirem. Agora, devidamente apontadas, o desacordo com a solução dada, quando não for viável o agravo de instrumento, fica devolvido ao recurso de apelação.

    O sistema de preclusão passa a se realizar de duas maneiras: imediatamente, para aqueles temas não provocados; elasticamente, para os que tenham sido devidamente apresentados.

    Na nossa percepção, temos uma preclusão elástica quanto às questões decididas em primeiro grau, na exata medida em que as mesmas podem ser ressuscitadas com a apelação. Somente a omissão na fase recursal quanto à tais questões sepulta-as definitivamente.

    Daí porque, a preclusão da questão decidida fica, por hipóstase, em estado letárgico até o não agir futuro da parte, ou seja, pela não reedição do ponto em segundo grau de jurisdição.

    A nosso pensar, essa elasticidade do fenômeno preclusivo justifica uma nova categorização do instituto da preclusão, eis que apresenta quid diverso frente à preclusão temporal, da qual seria mais próxima.

    A bem da verdade, a classificação da preclusão sempre observou a forma de sua ocorrência (pelo tempo, pela prática do ato ou contrariedade lógica), não o resultado que sempre é o mesmo.

    Diverso é o modo pelo qual opera a preclusão temporal (submetida exclusivamente ao non facere), da preclusão elástica, que fica em estado de suspensão por todo o arco procedimental após a parte suscitar determinada questão (facere). Enquanto a preclusão temporal se dá simplesmente pela não suscitação da questão oportunamente (non facere), a elástica ocorre pela ausência de sua ressuscitação na fase recursal, embora exigível a suscitação prévia no tempo e no modo devidos (facere colapsado por non facere posterior).

    A preclusão é elástica porque, observando adequadamente o fenômeno jurídico, não se produz exclusivamente — nem é inteiramente confinada —, ao segundo grau de jurisdição. Principia com a decisão interlocutória, mas se elastece, estica, seu desdobramento até o segundo grau, quando então se realiza pela omissão da parte.

    Inegavelmente, a alteração do sistema preclusivo acarretará inúmeras (in) consequências sobre a compreensão da dita preclusão pro iudicato, os pedidos de reconsideração e, principalmente, o próprio centro de gravidade do processo.

    O elastecimento na ocorrência das preclusões traz um deslocamento no centro de gravidade do processo, que deixa de ser, via de regra, a sentença de primeiro grau, passando para a fase de apelação, momento em que, potencialmente, todas as questões decididas serão revistas.

    Daí porque, o processo, ao invés de funcionar com um funil, afastando no seu intersecto uma miríade de questões para se concentrar na pretensão meritória, abre seu espectro em segundo grau para debate de toda e qualquer questão enfrentada no juízo a quo.

    Não bastasse a desvalia das decisões de primeiro grau, pela ausência de eficácia imediata, o fato é que o juízo revisório do Tribunal passar a ter a mesma abrangência, e mais eficácia, daquele realizado em primeiro grau. Agora, pode-se fazer coro com a afirmação de que a apelação repropõe a causa no Tribunal.

    Certamente, a preclusão elástica e a alteração do centro de gravidade do processo serão terrenos férteis para semeadura de problemas processuais.

    Retornando ao tropo do início, oxalá os frutos superem as ervas daninhas.


    [1] Utilizamos a expressão pela primeira vez em artigo publicado em 2011 (OLIVEIRA JUNIOR, Zulmar Duarte de. Preclusão elástica no Novo CPC (Org. Bruno Dantas). Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 48, n. 190, t. 2, p. 307, abr./jun., 2011), tomando de empréstimo a expressão empregada por CALAMANDREI, utilizada para outra dimensão do instituto, isto é, para a flexibilização da preclusão das ditas deduções de mérito, na forma dos artigos 183 e 184 do Código de Processo Civil italiano de 1940 (CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil: estudos sobre o Processo Civil. Tradução de Luiz Abezia e Sandra Drina Fernandez Barbery. Campinas: Bookseller, 1999. vol. I., p. 310/311). A expressão vem sendo reconhecida pela doutrina (RUBIN, Fernando. Fragmentos de processo civil moderno: de acordo com o novo CPC. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013). Ainda que para a crítica do instituto (MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Sem gestão, a morosidade da Justiça não acabará. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-dez-13/brasil-código-processo-civil Acesso em: 25-fev-16.

    [2] O artigo 223 do Novo CPC direciona no sentido da ausência de preclusão consumativa no Código, na medida em que permite a emenda do ato até o decurso do prazo legal. Porém, existem outras situações processuais em que a realização do ato consome a fase respectiva, como é regra geral o artigo 200 do Novo CPC. Viva será a controvérsia sobre o tema, a merecer estudo específico.

    [3] O agravo retido foi excluído do Código, sendo que o agravo de instrumento tem hipóteses de cabimento taxativas (artigo 1.015 do Novo CPC).

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